Algumas coisas ficam melhores depois que envelhecem. O filme “Space Jam” não é uma delas. Há 25 anos, o astro da NBA Michael Jordan era sequestrado por alienígenas e obrigado a se juntar ao coelho Pernalonga e a seus amigos Looney Tunes para conseguir sua liberdade.
Misturando animação e live-action, o filme de 1996 marcou época e foi campeão de bilheteria. Mas, ao ser revisto hoje, ele se torna uma obra recheada de piadas datadas e tomada por personagens machistas, sexistas e preconceituosos.
“Space Jam: Um Novo Legado” retoma a franquia e busca acertar a rota. Desta vez com o jogador de basquete LeBron James, o novo título estreia nos cinemas nesta quinta, dia 15, com várias mudanças em relação à história original e com piadas subliminares —como a dita pelo vilão AI-G Rhythm para LeBron: “Vou mandar você para os personagens cancelados”.
Uma dos maiores exemplos das mudanças é a coelha Lola Bunny, que havia roubado a cena entre os personagens no primeiro filme. Naquele fim de anos 1990, ela se expressava nas cenas em que aparecia como uma atleta veloz, ágil, competitiva, guerreira —e sexy.
Suas qualidades eram ofuscadas ao aparecer com um visual sexualizado e como objeto de desejo do Pernalonga. Duas décadas depois, no segundo filme, Lola aparece menos objetificada e mais esportiva. Seu romance com Pernalonga é deixado de lado, substituído por suas referências a jogadas famosas na NBA, tornando-se braço direito de LeBron.
O sexismo aparece também no caso de Pepe Le Pew. O personagem, um gambá que persegue o sexo feminino, tinha uma cena gravada na nova produção, mas foi excluída. Após a publicação de um texto de Charles M. Blow no New York Times ter acusado o personagem de incentivar a cultura do estupro e o comportamento abusivo contra mulheres, a única imagem em que o gambá aparecia na animação foi deletada. A gata Penélope, que sofria com a sua obsessão, também desapareceu da sequência.
Outros personagens também criticados em publicações e tuítes sofreram adaptações. Ligeirinho foi acusado de estereotipar o povo mexicano. Coyote e Papa-Léguas foram criticados pela violência no desenho. Gaguinho virou exemplo de personagem que sofre bullying. Todos continuam na nova história, mas atualizados aos novos tempos.
Gaguinho, por exemplo, que antes era deixado de lado em alguns momentos porque não conseguia terminar uma frase, agora aparece com pouca dificuldade para falar. Em uma cena importante do segundo filme, ele é chamado de Notorious B. I. G. e até desafia o vilão em uma batalha de rap.
Mas não foram só os cancelamentos que definem a volta de "Space Jam". A ótima trilha sonora permanece na sequência. A música que leva o nome da obra, do artista Quad City DJ’s, deixa saudade, mas é bem substituída pela “Pump Up The Jam”, do rapper Lil Uzi Vert.
Já a canção nostálgica “I Believe I Can Fly”, do rapper R. Kelly, que tocava durante a cena do ainda pequeno Michael Jordan em um quintal de barro jogando basquete no fundo de sua casa, foi substituída por “Hoops”, das rappers Salt-N-Pepa e Kash Doll. A cena mostra um LeBron James criança e viciado em Game Boy.
Mesmo assim, o tradicional sarcasmo e as piadas mais adultas do Pernalonga deram lugar, no novo longa, a um humor com apelo para o público infantil. Em algumas das cenas mais dramáticas, como as que mostram a relação entre LeBron James e sua família, há tiradas sem qualquer relação com o momento –o que parece uma obrigação de fazer o público rir a qualquer custo. Na obra original, o jeito carrancudo de Jordan é contraponto às maluquices dos personagens, deixando a trama mais natural.
Além disso, em alguns trechos, parece que a obra se tornou uma grande propaganda da Warner e da HBO. “Game Of Thrones”, “Harry Potter", “Matrix” e outras produções do conglomerado são visitados como universos paralelos no segundo longa e dão corpo para momentos sem muita história no novo "Space Jam".
Bill Murray, que no primeiro longa foi uma surpresa, não aparece desta vez. No seu lugar, foi reservada uma cena especial para o ator Michael B. Jordan —que, apesar do nome, não é parente do jogador de basquete. A aparição de poucos minutos do ator, astro de "Pantera Negra" e "Creed", é memorável.
Diferentemente de Jordan no longa de 1996, que precisou vencer a partida contra os alienígenas para resgatar as habilidades de seus colegas atletas, nesta nova história o enredo gira em torno de Dominic, filho mais novo do LeBron James, vivido pelo ator Cedric Joe. Ele deseja ser um programador de jogos de videogames, contrariando a vontade do seu pai, que o obriga a ser jogador de basquete.
Outros nomes famosos da NBA ficaram em segundo plano na história. Anthony Davis, Damian Lillard, Klay Thompson e as jogadoras da WNBA Diana Taurasi, Nneka Ogwumike e Chiney Ogwumike até aparecem, mas de forma relâmpago.
Comparando os dois filmes, “Space Jam: Um Novo Legado” tenta ressuscitar a saga e tentar excluir ao máximo tudo aquilo que gerou críticas nos últimos anos. Mas, ao ser visto na tela, o filme parece comprovar o que disse Joe Pytka, diretor do primeiro longa. Em entrevista à revista americana Entertainment Weekly, ele afirmou que acha ridícula a ideia de produzir uma segunda parte da história. E disse que LeBron James não se compara a Michael Jordan.
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